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Que o brasileiro é criativo e empreendedor, todo mundo sabe.
Mas daí a adaptar uma culinária milenar, cheia de técnicas
específicas e apetrechos, e praticamente resumida a 2 ou 3
ingredientes-base são outros 500. Crível ou não, a verdade é
que aconteceu. E assim surgiram as Temakerias, uma espécie
de fast-food de comida japonesa que só existe no Brasil.
Elas conquistaram o paladar principalmente dos jovens, os
principais clientes desses empreendimentos. “As temakerias,
assim como os rodízios, democratizaram a culinária japonesa,
melhorando e ampliando sua visibilidade e acessibilidade,
com preços baixos e localização favorável”, afirma o sushiman
Mário Tucillo, chef da São Paulo-Tokyo Temaki Sushi.
GASTRONOMIA
CONHEÇAOS ELEMENTOSQUECOMPÕEMACULINÁRIA JAPONESA
E DECIFRE O SUCESSO DAS TEMAKERIAS “MADE IN BRAZIL”
Sushi X Temaki
A culinária japonesa aportou no Brasil em 1908, junto com
os primeiros imigrantes, e demorou quase um século para
cair definitivamente no gosto dos brasileiros. Mas ela surgiu
centenas de anos antes, baseada principalmente no arroz,
cereal básico da dieta nipônica, que já foi utilizado, inclusive,
como moeda de pagamento de impostos pelos japoneses na
Idade Média. Por isso, até hoje os “bolinhos de arroz” são
servidos em datas especiais e comemorativas, como o ano
novo, além de compor o cardápio cotidiano dos japoneses
Mas são os temakis que têm conquistado o paladar dos
brasileiros. O ‘sushi em formato de cone’ é feito com alga e
recheado com arroz e peixe. Embora não tenham o mesmo
glamour que os sushis tradicionais, que exigem uma técnica
apurada na preparação – que inclui o uso de uma faca específica
para cada pescado – o temaki tem vários outros atributos
que facilitam sua aceitação pelos brasileiros: Ele é leve e
saudável, rápido de preparar e dispensa o uso de hashi, aqueles
‘pauzinhos’ que os orientais utilizam no lugar dos talheres.
E todos esses atributos favoreceram a instalação das
Temakerias, uma espécie de fast food de comida japonesa
criadas no Brasil por volta de 2004 – hoje, grande sucesso
entre o público, principalmente os jovens, que consomem o
prato especialmente antes ou depois da balada.
Com a assimilação dos chefs tupiniquins, o temaki ganhou
adaptações ao paladar brasileiro – a versão mais consumida por
aqui leva cream cheese no recheio, combinado ao salmão. Nos
Estados Unidos, a combinação mais conhecida é a ‘califórnia’,
que utiliza frutas como o abacate e a manga. “Não gosto muito
dessas inovações, pois perdem a característica tradicional do
prato”, diz o sushiman.
A rapidez das Temakerias contrapõe a tranquilidade da refeição
japonesa, composta por cinco pratos servidos simultaneamente:
a sopa, o cozido, o grelhado, a guarnição de legumes e o arroz.
A bebida principal é o chá, e a bebida alcoólica típica é o
saquê, um fermentado de arroz. Além dos pratos, o modo de
preparo, a apresentação e até os utensílios utilizados também
fazem parte de uma tradicional refeição japonesa. “Sushi e
sashimi são bem técnicos, exigem que o chef ou sushiman se
aprofunde no estudo, pois existe o jeito certo de cortar o peixe
e até de lavar o arroz”, conta Tucillo.
“A culinária japonesa também preza pela apresentação.
Historicamente, cada prato tem uma louça certa. O visual é
uma forma de melhorar a refeição”, acredita. Segundo ele,
os restaurantes e rodízios japoneses, além das Temakerias no
Brasil pecam nesse quesito: “ao servir em pratos de papelão
ou plástico os empreendimentos perdem qualidade. Eu sempre
prezei pela apresentação, não quero que perca a qualidade nem
a tradição dessa culinária”, pontua.
Ele ressalta que as Temakerias devem seguir as tradições
japonesas – e que as emprega no seu negócio. “A ideia é que o
cliente vivencie uma nova experiência em temakeria, que tenha
acesso a um menu super elaborado e possa desde fazer um
lanche rápido, sem gastar muito, até ficar por mais tempo, tudo
com o mesmo atendimento de qualidade, no mesmo ambiente
bem decorado, sofisticado e aconchegante”, finaliza o chef.
Origem
Temakis
Apresentação
e apreciadores da sua cozinha. “No Japão, não havia uma
grande variedade de ingredientes, então de um único alimento
surgiam diversos pratos”, revela Tucillo.
O sushi, talvez o prato mais conhecido dessa cultura, nasceu
da necessidade de conservação de outro ingrediente comum
nas refeições dos japoneses: o peixe. Antigamente, o pescado
raramente chegava fresco às mesas. “Durante séculos, versões
fermentadas em sal, algumas intragáveis para o nosso paladar,
foram desenvolvidas como forma de preservar grandes
quantidades de peixe após o fim da temporada de pesca. Em
algumas dessas técnicas de conservação, caso do shiokara, o
peixe era reduzido a uma pasta. Em outras, como o milenar
narezushi, o pescado, misturado ao arroz cozido permanecia
inteiro por um ano ou mais dentro de potes lacrados”, diz o
antropólogo japonês Naomici Ishige no livro The History and
Culture of Japanese Food (“A história e a cultura da comida
japonesa”, inédito no Brasil). A palavra “sushi” originalmente se
referia a esse tipo de peixe longamente fermentado.
Cercado pelo mar, o Japão também tem o seu território cortado
por diversos rios, o que explica a grande presença de pescados
na dieta nipônica. Ao contrário do que se imagina, o consumo
de peixe cru é raro na mesa cotidiana – os japoneses preferem
os peixes secos, principalmente nos temperos e caldos que
compõem a refeição.
TEXTO_DANIELA SANTOS